Confira as semelhanças e as principais diferenças entre títulos públicos, debêntures, fundos imobiliários, fundos de inflação e ETFs
O aumento da inflação, que tem estado no centro das discussões do mercado financeiro, também acendeu um sinal de alerta entre os pequenos investidores brasileiros, que, diante de retornos cada vez menores das aplicações mais conservadoras, precisam agora se preocupar também em evitar que a alta dos preços corroa os rendimentos em um cenário já desafiador para a alocação.
E as preocupações têm sido cada vez mais reforçadas. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) registrou inflação de 0,86% em outubro na comparação com setembro, o maior resultado para o período desde 2002. No ano, o IPCA acumula alta de 2,22% e, em 12 meses, de 3,92%.
No relatório Focus, do Banco Central, as estimativas para o indicador têm sido sucessivamente revisadas para cima. A projeção mais recente do mercado aponta para inflação de 3,45%, neste ano, e de 3,40%, no próximo.
Neste contexto, ter ao menos uma parte da carteira reservada a ativos que ofereçam retornos reais, isto é, acima da inflação, ganha ainda mais relevância na vida do investidor.
Essas alternativas podem ser encontradas tanto em aplicações de renda fixa, como títulos públicos, fundos de investimento e debêntures, quanto de renda variável, via fundos imobiliários.
Confira a seguir cinco aplicações financeiras recomendadas por especialistas para proteger o capital da alta da inflação e conheça como remuneram, os principais riscos e os custos envolvidos.
Títulos públicos
Uma das aplicações mais acessíveis para proteger o poder de compra do investidor ao longo do tempo recai sobre títulos públicos do tipo Tesouro IPCA+, com ou sem pagamento de bônus semestrais.
Esse é um papel que combina uma parte de retorno prefixado, definido no momento da compra do papel, e o restante indexado à inflação, medida pelo IPCA. No caso do pagamento de cupom, o investidor recebe o retorno antecipadamente, duas vezes ao ano.
Atualmente, as taxas de juros reais (ou seja, descontada a inflação) pagas por esses papéis superam os 4%, no caso daqueles com vencimentos mais longos, a partir de 15 anos.
A planejadora financeira certificada CFP Leticia Camargo afirma que o investidor precisa estar atento ao vencimento do papel, uma vez que, se vender antes do prazo, as taxas podem sofrer alterações – para cima ou para baixo.
A recomendação, segundo ela, é que o investidor case o prazo do investimento com seus objetivos, para garantir a taxa contratada no momento da aplicação. “É preciso tomar cuidado, porque a volatilidade do Tesouro IPCA+ é muito alta”, diz, especialmente no que se refere aos vencimentos mais longos.
Leticia lembra que, neste ano, por conta do estresse do mercado em meio à pandemia, investidores pediram prêmios mais altos para emprestar recursos ao governo. Desta forma, caso decidisse fazer o resgate antecipado, o investidor poderia ter amargado perdas. Em setembro, por exemplo, as baixas chegaram a até 12,4% no Tesouro IPCA+2045.
Isso porque, à medida que piora a avaliação do mercado sobre a evolução das contas públicas, entre outros fatores, os prêmios que o governo precisa pagar para se financiar aumentam, e provocam uma queda nos preços dos títulos que estão nas mãos dos investidores, especialmente nos de mais longo prazo. Quanto maior a taxa de juros, menor o valor do título. E vice-versa.
“Há uma incerteza com relação à segunda onda de Covid-19 que pode levar à prorrogação do auxílio emergencial, a um risco fiscal e a dúvidas se as reformas vão passar. Que o governo vai gastar em 2020 já está dado pelo mercado, mas, se isso permanecer em 2021, pode estressar ainda mais”, afirma a planejadora financeira.
Na Portofino Multi Family Office, Thomás Gibertoni conta que os papéis indexados à inflação foram incluídos nas carteiras dos clientes por conta dos prêmios mais atrativos, em especial nos vencimentos intermediários, de 2026 a 2028, com o objetivo de manutenção até o vencimento. Nesta sexta-feira (27), o Tesouro IPCA+ 2026, disponível para compra no Tesouro Direto, oferecia um prêmio real de 2,95% ao ano.
“Não tem muito mais espaço para aumento de taxa no momento e, olhando para frente, o cenário é binário: ou beira o descontrole fiscal ou o governo mostra a sua responsabilidade e faz planos para cortar gastos”, diz.
Dito isso, a gestora de patrimônio prefere se posicionar de forma a aproveitar as taxas atuais, mas estabelecendo um limite de exposição, dado que o cenário pode levar a um novo aumento dos prêmios.PUBLICIDADE
Com relação aos custos, a B3 cobra taxa de custódia de 0,25% ao ano sobre o valor total dos títulos. Atualmente, a grande maioria das corretoras e instituições financeiras trabalha com taxa zero de administração.
Fundos de inflação
Enquanto nos títulos públicos o investidor escolhe sozinho quais ativos vão compor seu portfólio, nos fundos de inflação, é o gestor que determina quais papéis e vencimentos farão parte da seleção.
Nesses fundos, a carteira é composta por uma cesta de títulos públicos indexados ao IPCA, que tem como objetivo superar um índice, normalmente o “IMA-B” ou o “IMA-B 5”, com prazo de até cinco anos, ou “IMA-B 5+”, com vencimentos dos papéis iguais ou acima de cinco anos.
“Ao comprar um título diretamente, você sabe qual taxa está comprando e, se levar até o vencimento, o retorno que vai receber. Se você compra um fundo, não sabe a taxa, mas pulveriza a carteira”, afirma Roberto Agi, planejador financeiro com certificação CFP.
Nos fundos, contudo, importante lembrar que há cobrança de come-cotas, taxa de administração e eventual taxa de performance.
Para Gibertoni, da Portofino, os fundos de inflação são uma boa opção para o pequeno investidor que pode precisar resgatar o montante investido antes do prazo estipulado pelo Tesouro.
Leticia concorda que são opções interessantes para compor e diversificar o portfólio do investidor, mas reforça que são investimentos de longo prazo e não devem configurar reserva de emergência. “O ideal é escolher aqueles com prazos não tão curtos, porque costumam sofrer mais em momentos de crise”, diz.
Segundo ela, esses fundos são uma boa opção para o investidor que está dando os primeiros passos no mercado financeiro e ainda não consegue fazer as escolhas sozinho.
ETFs de renda fixa
Ganhando cada vez mais espaço no mercado, os ETFs de renda fixa replicam o desempenho de índices que acompanham títulos públicos e privados prefixados ou atrelados à inflação.
Ao todo, há hoje oito produtos negociados na B3, sendo cinco deles atrelados ao IPCA. É o caso do “B5P211”, novidade da indústria neste mês, que acompanha a evolução da carteira de papéis com prazos de até cinco anos. A taxa de administração é de 0,20% ao ano.
Há ainda dois ETFs que acompanham a evolução da carteira de títulos indexados à inflação com prazo igual ou superior a cinco anos (“IB5M11” e “B5MB11”), além de outros dois que replicam o IMA-B geral (“IMAB11” e “IMBB11”) – formado por todos os títulos que compõem a dívida pública. As taxas de administração variam de 0,20% a 0,25% a.a.
Agi diz gostar da classe por ser uma forma rápida e acessível de investir em uma cesta de ativos, e com vantagem tributária em relação aos fundos de investimento tradicionais. Isso porque a alíquota de Imposto de Renda sobre os rendimentos é sempre de 15%, independentemente do prazo da aplicação.
Gibertoni, da Portofino, também destaca a vantagem do ponto de vista tributário, mas chama atenção para a menor liquidez dos ativos.
“O mercado está tentando se desenvolver, mas o que falta é a liquidez. O investidor local ainda não tem o costume de utilizar esse tipo de investimento, mas, quando forem mais líquidos, será uma opção melhor que a dos fundos [de inflação]”, diz.
Debêntures
Nos produtos de crédito privado, as debêntures com retorno atrelado ao IPCA também são interessantes para compor o portfólio e proteger o capital do aumento da inflação.
Diferentemente dos títulos públicos, em que os papéis financiam o governo federal, na compra de uma debênture, o investidor está emprestando dinheiro para uma empresa.
Não são todas as debêntures, contudo, que são atreladas ao IPCA. Também estão disponíveis no mercado produtos com retorno prefixado, com taxa definida no momento da aplicação, e pós-fixados, atrelados à Selic.
Pelo fato de o investidor estar exposto a uma empresa, ele precisa se atentar ao risco de crédito dos papéis, destaca Agi. “É preciso entender as garantias, o rating da empresa e se o prêmio oferecido é condizente com o risco da companhia.” Quanto maior o rating, menor o risco.
Por ser necessário investigar mais antes de comprar uma debênture, Agi sugere que o investimento seja feito nesse caso por aqueles com perfil a partir do moderado. Vale lembrar que debêntures não contam com proteção do Fundo Garantidor de Créditos (FGC).
De acordo com Leticia, se o investidor não tiver grande conhecimento sobre o mercado e tempo para estudar as empresas, a recomendação é investir via fundos de debêntures, que contam com uma gestão profissional para fazer as escolhas. Além disso, há maior diversificação do portfólio e pulverização dos riscos, diz.
Segundo a planejadora financeira, embora existam opções com vencimentos mais curtos, o ideal é que o investidor tenha um horizonte de investimento de no mínimo três a cinco anos. Há debêntures com prazos acima de dez anos.
Fundos imobiliários
Um dos investimentos que têm ganhado cada vez mais espaço na carteira dos investidores brasileiros são os fundos imobiliários, em meio a um cenário de juros na mínima histórica.
E diante da alta da inflação, FIIs voltados para renda e que possuem, no portfólio, ativos com contratos de aluguel atrelados ao IPCA e ao IGP-M podem se beneficiar desse cenário.
No ano, o IGP-M, utilizado principalmente no cálculo do reajuste anual dos contratos de aluguel, acumula valorização de 22% até novembro. Em 12 meses, a alta é de 24,5%.
Com aplicações mínimas abaixo de R$ 100, os fundos imobiliários são acessíveis, mas, por serem de renda variável e estarem sujeitos a oscilações bruscas, são recomendados para investidores de perfil moderado, afirma Agi.
Gibertoni também diz gostar do investimento em FIIs, mas destaca que é importante que o investidor destrinche a carteira, de forma a entender no que está investindo e escolher o melhor mercado para estar posicionado.
Entre os segmentos preferidos da gestora de patrimônio, o especialista cita os fundos de recebíveis imobiliários e os residenciais, que vêm ganhando atenção diante dos juros baixos aumentando a tomada de crédito habitacional, assinala.
É preciso ficar de olho, contudo, na alta da Selic no próximo ano, que pode tirar parte da atratividade dos produtos, afirma.
Leticia, por sua vez, destaca que, nos fundos imobiliários, o investidor hoje também precisa mensurar o impacto da pandemia sobre os imóveis.
“Nos FIIs, os imóveis podem ter alta na taxa de vacância, com impacto sobre as cotas. Tem que entender se o shopping recuperou as vendas, se as lajes estão devolvendo escritórios, então é uma questão adicional que precisa ser analisada antes de investir”, afirma.
Isso porque, por mais que a inflação esteja mais pressionada no ano, o fundo pode não conseguir repassar o aumento dos preços para os inquilinos por conta da crise.
Uma boa opção, segundo ela, são os fundos imobiliários de papel, que possuem na carteira papéis de renda fixa como Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) e Letras de Crédito Imobiliário (LCIs).
Por Mariana Zonta d’Ávila no Infomoney